Sebastião Vila Nova

Por Emílio de Britto Negreiros (UFPE)

Um sociólogo pernambucano, mas não somente sociólogo…

Vila Nova viveu até 2 de janeiro de 2018, 15 anos depois de um acidente vascular cerebral que o foi privando da vida pouco a pouco, e que o forçou prematuramente à aposentadoria em 2003. Viveu 73 anos, nascido em 18 de janeiro de 1944, em Rio Largo, em Alagoas, mas radicado em Pernambuco, para onde a família migra (ele então com 6 anos) em busca de melhores condições de vida e trabalho.

Sua obra mais importante – inspiração para várias gerações de estudantes das Ciências Sociais no Brasil – é, sem dúvida, Introdução à Sociologia, publicado pela Atlas, desde 1981. Coordenou durante muito tempo o Seminário de Tropicologia, na FUNDAJ (Fundação Joaquim Nabuco), onde trabalhou como pesquisador (Vila, como o chamávamos, foi o Superintendente do Instituto de Tropicologia, um dos mais relevantes cargos da FUNDAJ, e editor da revista oficial desta instituição, a Ciência & Trópico, até 2002), atuando, também por toda vida, como professor universitário (na Universidade Católica de Pernambuco). Além de pesquisador e professor, Vila era igualmente poeta, ensaísta e músico. Sabedor de seu talento e competência, fascinava pela sua erudição em sala de aula, demonstrando ao mesmo tempo rigor didático e fidelidade teórica à sociologia, talvez a maior de suas paixões, que era versada com um inteligente senso de humor ácido e preciso.

Depois de assistir a uma aula sua era impossível não se encantar pela sociologia e pelo ofício de sociólogo-professor. As aulas – e ele próprio -, eram performáticas, e isso com certeza tinha a ver com seu passado ligado ao teatro, à música (como compositor) e às radionovelas pernambucanas (em algumas das quais foi rádio ator, ainda criança). Sabia dos livros de cor, nome de autores, datas de publicação, editoras, tradutores, e passagens inteiras que ele literalmente recitava em sala, talvez fruto de sua experiência de árduo trabalho como balconista na antiga e “respeitável” (nas palavras dele mesmo) Livraria Companhia Editora Nacional, por meio da qual manteve contato com a intelectualidade pernambucana à época. A livraria era um ponto de encontro e um elo entre ele, os (as) intelectuais (mas não somente estes ou estas) e o intelectual que ele viria a ser, mesmo que por algum momento tenha cogitado ingressar na vida religiosa, quando neste meio do caminho foi aceito no Seminário de Olinda. Os “mestres” torceram com mais força e ele se converteu à vida acadêmica, e é, por isso, hoje ainda, impossível esquecer de suas aulas…em que todas essas histórias também apareciam como parte desse seu artesanato intelectual.

Apesar da memória que não lhe foi devida no fim, sua trajetória intelectual se impõe até hoje como uma marca inquestionável da qualidade de seu trabalho e de sua obra (que é bastante extensa, aliás, e que vai dos fundamentos à metassociologia, como ele costumava dizer, ou de uma sociologia reflexiva weberianamente orientada, por assim dizer. Este era seu campo de estudo e pesquisa. O catálogo completo de sua obra pode ser consultado em um trabalho importante e meticuloso realizado por Virgínia Barbosa e Lúcia Gaspar, publicado pela própria FUNDAJ e disponível na internet, no qual esta nota se apoia). A comunidade acadêmica universitária (da Sociologia em Pernambuco, especialmente) ainda lhe deve – mais amplamente – o merecido reconhecimento, comunidade esta da qual ele fez parte diretamente desde a sua graduação em Ciências Sociais e mestrado em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco, e também de suas experiências internacionais na Universidade de Chicago e na Universidade Internacional de Lisboa.

Como sua mãe, que na pobreza dividia um pão entre ela e seus três filhos, de quando em vez (porque nem sempre era possível comprar pão), para que não esquecessem do sabor deste alimento ao mesmo tempo simples e fundamental, Vila também soube dividir o “pão” que recebeu, mesmo que fosse pouco, mesmo que fosse para muitos. Fez isso consigo, com seus próprios filhos (filha e filho, na mais imperfeita ordem dos desencontros e na perfeita desordem dos encontros), com sua própria vida e com o seu trabalho. Vila, de certa forma, ainda vive!

Sugestões de obras do autor:

VILA NOVA, Sebastião. Arte e Cultura: uma perspectiva sociológica. Recife, PE: Editora Bagaço, 1995.

VILA NOVA, Sebastião. Introdução à Sociologia. 3.ed. São Paulo: Atlas, 1995 (1981).

VILA NOVA, Sebastião. Sociologias e Pós-Sociologias em Gilberto Freyre: algumas fontes e afinidades teóricas e metodológicas do seu pensamento. Recife, PE: FUNDAJ/Editora Massangana, 1995.

VILA NOVA, Sebastião. Donald Pierson e a Escola de Chicago na sociologia brasileira: entre humanistas e messiânicos. Lisboa, Portugal: Coleção Veja Universidade/Ciências Sociais e Políticas, 1998.

VILA NOVA, Sebastião. A realidade social da ficção. Recife: Fundaj/Editora Massangana, 2005 (1975).