Por Mercês Somarriba (UFMG)
Otavio Soares Dulci nasceu em Santos Dumont, Minas Gerais, em 8 de março de 1948 e faleceu em Belo Horizonte em 9 de outubro de 2018.
Graduou-se em Ciências Sociais pela UFMG em 1970, tornou-se Mestre em Ciência Política, também na UFMG, em 1977, e concluiu seu Doutorado no IUPERJ em 1997.
Sua trajetória profissional é de enorme riqueza: realizou intensas atividades de pesquisa nos campos da sociologia e das ciências políticas tendo produzido obras originais e duradouras nas seguintes áreas de conhecimento: Sociologia Política, Sociologia do Desenvolvimento, Sociologia Brasileira, Política Comparada, Política Internacional, Política Brasileira e Políticas Públicas.
Em algumas dessas áreas, tematizou principalmente o estado de Minas Gerais. Firmou-se, por exemplo, como o pesquisador com maior conhecimento da história do Legislativo de Minas ao publicar, em 2005, o livro Diálogo com o Tempo – 170 anos do Legislativo mineiro, em coautoria com Maria Auxiliadora de Faria. Nessa obra de consulta obrigatória sobre o Legislativo Mineiro, os autores analisam a atuação desse poder estadual reconstituindo sua trajetória desde sua fundação, em 1835, passando pela Assembleia Provincial durante o Império, pelo Congresso Mineiro na Primeira República e, finalmente, pela Assembleia Legislativa a partir de 1947. Outro livro seu, Política e Recuperação Econômica em Minas Gerais, sua tese de Doutorado publicada pela UFMG em 1999, é uma análise sociológica, em diálogo com a Economia a Política e a História, acerca da concertação política em torno da recuperação econômica de Minas Gerais entre 1930 e a década de 1950. Sua premissa é que “…a história da industrialização brasileira envolve uma pluralidade de experiências regionais irredutíveis à via paulista” calcada em fatores de mercado (p.32). Distintamente, a marca característica do projeto modernizador mineiro teria residido numa via que empregava recursos políticos para aproveitar condições potenciais de mercado. O processo se daria por impulso interno, pela combinação de fatores políticos e econômicos. Assim, com a análise do caso mineiro Dulci joga luz nova sobre a variabilidade de padrões de desenvolvimento em situações de atraso, e convida a novas análises sobre o desenvolvimento desigual em perspectiva comparada.
Otavio Dulci conciliou, como poucos, sua expressiva produção intelectual, registrada nesses e em muitos outros livros e num grande número de artigos e ensaios publicados em conceituadas revistas especializadas, com uma dedicação fora do comum ao ensino. Otavio foi, sobretudo, um grande professor. Um Mestre. Com seu jeito sereno, discreto e terno ofereceu no Departamento de Sociologia da FAFICH-UFMG, onde atuou por mais de trinta anos, desde as disciplinas introdutórias do antigo Ciclo Básico, passando pelas optativas e obrigatórias da Graduação, até disciplinas do Mestrado em Sociologia e do Doutorado em Ciências Humanas às quais acorriam numerosos alunos de outros programas de pós-graduação da UFMG.
Na PUC MINAS, aonde foi trabalhar após se aposentar na UFMG em 2005 e permaneceu até sua morte, Otavio continuou atuando tanto na graduação como na pós-graduação, pondo em prática o salutar princípio pedagógico de que a formação dos alunos só tem a ganhar, quando os melhores professores se dedicam também a disciplinas introdutórias. Expressão clara do reconhecimento dos alunos de graduação à atuação de Otavio como professor é o fato de ele ter sido escolhido 15 vezes Paraninfo ou Professor Homenageado pelos formandos, nas duas instituições em que atuou. Em seu currículo Lattes, Otavio registrou essas homenagens no item Prêmios, numa clara validação afetiva das iniciativas dos alunos. Orientador prolífero em todos os níveis de ensino nas duas universidades, Otavio orientou 35 dissertações de Mestrado, 10 de Doutorado e, ao todo, quarenta trabalhos divididos entre Monografias, Trabalhos de Conclusão de Curso e de Iniciação Científica.
Deu também contribuições relevantes para a construção institucional no âmbito nacional e local. Foi o principal responsável pela organização do XII Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia, realizado em Belo Horizonte em 2005, e consultor da CAPES e do CNPq. Na UFMG, foi membro do Conselho Universitário nos períodos 1983/85 e 1995/98 e participou ativamente na criação e implantação do Mestrado em Sociologia; na PUC MINAS, atuou na criação e implementação da Graduação em Relações Internacionais.
Intelectual público profundamente dedicado à compreensão do seu tempo, Otavio compartilhou e difundiu seus estudos, descobertas e interpretações da economia, da política e das sociedades brasileira e mineira, não só no âmbito acadêmico, mas também junto a um contingente numeroso e diversificado de audiências compostas por trabalhadores organizados em sindicatos, associações de classe empresariais, militantes de partidos políticos e de movimentos sociais populares. Com sua peculiar solicitude, atendia, até mesmo, a frequentes demandas de pequenos grupos informais de pessoas ansiosas por compreender a situação política do País, notadamente nos momentos de maior perplexidade e angústia que temos vivido em anos recentes. Assim, participou, ao longo de sua vida, de numerosos congressos, seminários, encontros e simpósios nacionais e internacionais de Sociologia e Ciência Política, ao lado de incontáveis debates, encontros e rodas de conversa, desenvolvendo suas famosas e indispensáveis Análises de Conjuntura.
Por tudo isso a morte de Otavio Dulci deixou um enorme vazio no meio acadêmico e político mineiro e belo-horizontino; e muita saudade entre os que, como eu, tiveram o privilégio de conviver e trabalhar com ele.
Sugestões de obras do autor:
DULCI, O. S. (1986) A UDN e o Anti-populismo no Brasil, 1ª. ed. Belo Horizonte: UFMG/PROED, v.1, 230 p.
DULCI, O. S.; FARIA, M. A. (2005) Diálogo com o Tempo – 170 anos do Legislativo mineiro, 1ª, ed. Belo Horizonte: Assembleia do Estado de Minas Gerais, v. 1, 390 p.
DULCI, O. S. (1999) Política e Recuperação Econômica em Minas Gerais, 1ª. ed. Belo Horizonte: UFMG, v. 1, 301 p.
DULCI, O. S. (2017) Minas Gerais 2000 – 2015, 1ª ed. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, v. 1, 115 p.