Por Verônica Toste Daflon (UFF)
Moema Eulália de Oliveira Toscano nasceu em 3 de janeiro 1927 em Garibaldi, Rio Grande do Sul. Seus pais, Adília de Oliveira Toscano e José Toscano Netto, eram funcionários públicos e a incentivaram a estudar e se profissionalizar, encorajando-a a seguir um caminho de independência distinto daquele trilhado pela maior parte das mulheres de sua época. Moema formou-se na Escola Normal, dando início à carreira de professora em cidades do interior gaúcho.
Conquistou o 1º lugar em um curso de especialização e, como prêmio, recebeu uma bolsa de estudos para estudar Educação Física na Universidade Federal do Rio de Janeiro, diplomando-se em 1952.
Em sequência, ingressou na Faculdade Nacional de Filosofia da atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde cursou Ciências Sociais. Frequentou também o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISER), onde atuou como auxiliar de ensino. Na ocasião de sua formatura, em 1959, redigiu um discurso que chamava atenção para a baixa presença de mulheres docentes em sua faculdade. Moema manifestou pioneiramente o interesse em pesquisar, de um ponto de vista sociológico, a situação da mulher, tema que só seria discutido de forma sistemática na sociologia a partir da década de 1970.
Após a formatura, Moema passou a lecionar no Instituto de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em 1964, foi submetida a um Inquérito Policial Militar e aposentada compulsoriamente da universidade. A respeito do episódio, comentou: “Eu abri o jornal em um sábado de manhã e lá estava o meu nome, primeiro na lista dos aposentados à força pelo chamado Ato Institucional n.1”.
Como consequência, foi lecionar em escolas na Baixada Fluminense e Duque de Caxias e foi acolhida pelo Departamento de Sociologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Publicou, em 1969, o livro “Introdução à sociologia educacional” e, em 1974, “Teoria da Educação Física Brasileira”. Em depoimento, afirmou que “a sociologia era como um pulmão por onde a gente podia respirar alguma coisa naquele clima [de Ditadura Militar]”.
O ano de 1975 foi um marco para o feminismo global. A Organização das Nações Unidas o intitulou Ano Internacional da Mulher e promoveu a I Conferência Mundial da Mulher, cujo tema central foi a eliminação da discriminação e o avanço social feminino. No Brasil, o escritório regional da ONU patrocinou a Semana de Pesquisas sobre o Papel e o Comportamento da Mulher Brasileira, da qual Moema Toscano foi uma das principais idealizadoras.
A iniciativa foi fundamental para a criação do Centro da Mulher Brasileira, sediado no Rio de Janeiro. Moema foi fundadora da entidade e fez parte do seu quadro durante 25 anos, até a dissolução no ano 2000. As atividades do CMB envolviam grupos de reflexão e trabalho, desenvolvimento de pesquisas e monitoramento de políticas públicas. Ela se envolveu particularmente com a agenda das creches, produzindo levantamentos da sua distribuição e vagas, monitorando o cumprimento da legislação trabalhista nessas instituições, entre outras ações. A socióloga foi ainda membro do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher do Estado do Rio do Janeiro e participou das inúmeras lutas da sociedade civil nos anos 1970 e 1980.
Suas escolhas refletem sobretudo sua visão de feminismo. Dentro do CMB, assim como no campo do feminismo dos anos 1970 e 1980 em geral, coexistiam diversas vertentes de feminismo, como o liberal, o radical e o socialista. Embora fosse influenciada por outras correntes, Moema tinha afinidades sobretudo com o feminismo socialista e sua ênfase na situação das trabalhadoras urbanas e rurais.
Em 1976, defendeu tese de livre docência na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, intitulada “Caminhos cruzados do feminismo”. A tese se debruçava sobre a presença feminina na política nacional, tomando como eixos de análise os sindicatos e o poder Legislativo. Com a anistia política, foi reintegrada à UFRJ em 1979, onde lecionou até se aposentar aos 75 anos.
Nesses e nos anos seguintes, Moema publicou diversos livros dedicados à questão da mulher: “Mulher e política”, em coautoria com Fanny Tabak (1982), “Mulher rural: contribuição ao estudo da situação da mulher no campo”, com Léa Anastassakis e Vera Lins (1983) e “A revolução das mulheres: um balanço do feminismo no Brasil”, com Miriam Goldenberg (1992).
Na sua produção mais tardia, voltou seu olhar para o sistema escolar, levando os insights da teoria da reprodução de Bourdieu e Passeron para o campo de pesquisa das desigualdades de gênero. Os resultados foram publicados nos livros “Igualdade na escola: preconceitos sexuais na educação” (1995) e “Estereótipos sexuais na educação: um manual para o educador” (2000).
Em abril de 2012, foi agraciada com a Medalha Chico mendes de Resistência, concedida pelo grupo Tortura Nunca Mais em reconhecimento à sua resiliência diante das injustiças e perseguições que sofreu da Ditatura Militar. Moema Toscano faleceu em 2017, aos 90 anos.
Sugestões de obras da autora:
TOSCANO, Moema. Introdução à sociologia educacional. 2010. Petrópolis: Vozes.
TOSCANO, Moema; GOLDENBERG, Miriam. A revolução das mulheres: um balanço do feminismo no Brasil. 1992. Rio de Janeiro: Revan.
TOSCANO, Moema. Estereótipos sexuais na educação: um manual para o educador. 2000. Petrópolis: Vozes.