Por Ricardo Luiz Sapia de Campos (UFG/IIFA)
Leila de Menezes Stein foi uma socióloga curiosa e sagaz que atuou a vida toda construindo conhecimento que servisse às causas populares e democráticas. Nasce no Rio de Janeiro em 1944 e, em 1967, conclui o curso de graduação em Ciências Sociais na UFRJ. As preocupações acerca da chamada “questão nacional” permeavam as correntes democráticas e de esquerda conjugando estudos acadêmicos com intervenção social. O ambiente pulsante do Rio de Janeiro e os debates que tinha com o pai, membro do PCB – Partido Comunista Brasileiro, foram centrais na sua formação.
A efervescência dos “anos 60”, o trabalho como educadora popular levaram Leila ao Centro de Estudos Noel Nutels, que congregava ex presos políticos e estudantes de pós graduação. Influenciada pelo trabalho de campo e pelos encontros sobre mão de obra volante do Departamento de Economia Rural da Unesp publica na Revista Contrapontos texto sobre a organização dos trabalhadores na agricultura. A publicação, junto com outras do grupo, ganha notoriedade, e é referenciada pelos cientistas sociais David Goodman e Michael Redclift (1977).
Em 1973, influenciada pela ideia de que o capitalismo cria condições para construção de focos de resistência, Leila vai para o sudoeste paulista estudar os chamados “Gatos e Boias Frias”. Este trabalho levaria a socióloga para o Departamento de Economia Rural da Unesp Botucatu, atuando, diligentemente, orientada pelo entendimento, segundo o qual, os trabalhadores agrícolas constroem resistências à exploração no próprio processo de trabalho. Em 1991 conclui mestrado na PUC São Paulo com o tema “Corporativismo e Sindicato na agricultura no Brasil nos anos 1930 a 1945”; em 1997, o doutorado na UNICAMP com a tese: “A formação do sindicato de trabalhadores agrícolas no Brasil – 1954-1964”.
Em 1977 com a mudança para São Paulo, compõe juntamente com outros estudantes de Pós Graduação e profissionais da área, a informalmente conhecida “Liga Agrária”, grupo de pesquisa na ASESP – Associação dos Sociólogos do Estado de São Paulo. Em 1985 presta concurso e vai para Unesp, onde permanece como professora pesquisadora até se aposentar em 2011.
Nos últimos vinte anos de vida, Leila priorizou temas ligados ao sindicalismo urbano, migrantes, restruturação produtiva, e organização do mundo do trabalho, resultando na livre docência: “Sindicato, Globalização e Representação: velhos e novos paradigmas”. Seu último trabalho ligado ao tema da ruralidade foi em torno do projeto que coordenou no âmbito do CNPQ: “O perfil da liderança sindical rural paulista”, no rescaldo da linha de pesquisa: “Classes sociais e representação, sindicatos e novas institucionalidades”, projeto que formou uma geração de pesquisadores no âmbito do extinto Departamento de Sociologia da Unesp Araraquara.
Em 2008, a partir da atuação como líder do Grupo de Estudos – “Trabalho e Trabalhadores” – criou a REDD – Revista de Estudos Diálogo e Desconexão, juntamente com orientandos e alunos do antigo PPGS – Programa de Pós Graduação em Sociologia. A publicação, interrompida com a morte de Leila Stein, congregava uma linha e uma proposta editorial originais. Entre as referências intelectuais mais fortes que estimulava nos orientandos e alunos leitura atenta destacam-se Leo Panitch, David Harvey, Andre Gorz, Clauss Offe, e sobretudo Edward Thompson. Tinha especial admiração pelo trabalho de Wanderley Guilherme dos Santos, com quem realizamos, conjuntamente, entrevista publicada na Revista Estudos de Sociologia. (2004).
Entre seus vínculos ativos, é possível destacar a atuação envolvente e propositiva junto a associações e escolas para inclusão de pais e portadores de paralisia cerebral, um envolvimento tributário da contingência pessoal de ter uma filha portadora.
Em 2012, logo após a aposentadoria, em meio ao furacão Sandy, realizou pós doutorado no Instituto Murphy de Estudos do Labor – CUNY, em Nova Iorque. Leila Stein deu o último trago no seu cigarro na manhã do dia 31 de julho de 2018 na cidade de Araraquara – SP.
Sugestões de obras da autora
STEIN, L. M.. Trabalhismo, círculos operários e política – a formação do sindicato dos trabalhadores agrícolas no Brasil (1954-1964). 1. ed. São Paulo: FAPESP/ Annablume, 2008.
STEIN, L. M.; CAMPOS, R. L. S. Ciências Sociais e trajetória intelectual. Entrevista com Wanderley Guilherme dos Santos. Estudos de Sociologia (São Paulo), Araraquara, v. 16, p. 37-56, 2004.
STEIN, L. M.. Trabalho Informal e Migrantes nos Estados Unidos. A nova via de organização sindical. Estudos de Sociologia (São Paulo), Araraquara, v. 17, p. 172-177, 2004.
STEIN, L. M.; PELEGRINI, T. (Org.) ; CARMO, S. M. (Org.) . Cidadania e Educação: Leituras em Direitos Humanos. Araraquara: Cultura Acadêmica/Editora UNESP, 1999.
STEIN, L. Gatos e ‘Bóias ‐ Frias’, Centro de Estudos Noel Nuts, Cadernos, Niterói (3), 1976.
Sobre a autora
GOODMAN, D. e REDCLIFT, M. The Bóias- Frias: rural proletarizaton and urban marginality in Brazil, pag.348 – 363 – In International Journal of Urban and Regional Research, vol. I, Number 2, 1977, London: Edward Arnold Publishers.