Por Claudiana Guedes de Jesus (UFRRJ) e Nanci Stancki da Luz (UFTPR)
Leda Maria Caira Gitahy nasceu em 26 de junho de 1949 na cidade de São Paulo. O estímulo familiar foi fundamental para a sua dedicação aos estudos. Com sua mãe, Eunice Caira Gitahy, aprendeu a gostar de literatura, e com seu pai, Heraldo de Souza Gitahy (in memoriam), pesquisador do Instituto de Pesquisas Tecnológicas – IPT e professor da Poli/USP, se inteirou da discussão sobre a importância do desenvolvimento da pesquisa endógena no país.
Leda iniciou o curso de Artes Plásticas na FAAP (1968) e História na USP (1969), mas o contexto de repressão da Ditadura Militar obrigou-a a alterar os caminhos de sua vida acadêmica quando, em outubro de 1968, durante o Congresso da UNE em Ibiúna/SP, foi presa. Através da militância política estudantil encontrou Bernardino Ribeiro de Figueiredo, companheiro de vida e pai de seus dois filhos. Na época, Bernardino era Presidente do Grêmio da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP e, atualmente, é Geólogo e professor Emérito da Unicamp.
A promulgação do AI-5, em 1969, e a intensificação das perseguições políticas obrigaram Leda e Bernardino a deixar o país e, por via terrestre, se deslocaram para Santiago do Chile. De 1970 a 1973, Leda foi aluna regular do curso de Sociologia da Universidade do Chile. De 1970-1971, atuou como auxiliar de pesquisa no “Fondo de Educación y Extención Sindical”. O golpe militar no Chile, em 1973, e a repressão instaurada naquele país, frustraram a perspectiva e a construção de uma vida acadêmica e política. Com a proteção da Comissariado de Refugiado da ONU, deixaram o país e rumaram para Suécia. Após um tempo em campo para refugiados na Suécia, foram morar em Uppsala, onde residiram de 1973 a 1980.
Fora do Brasil, nasceram seus dois filhos. Guilherme Gitahy de Figueiredo, primeiro filho, nasceu no Chile; é antropólogo e professor da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), casado com Eliane Góis da Silva. Francisco Gitahy de Figueiredo, segundo filho, nasceu na Suécia, é urbanista e arquiteto pela USP; é casado com Isaldete Rosa de Souza e pai de Sofia Souza Gitahy de Figueiredo e Ian Souza Gitahy de Figueiredo.
A continuidade de sua formação acadêmica em sociologia aconteceu no exterior quando, em 1974, ingressou na Universidade de Uppsala, instituição na qual concluiu a graduação em Sociologia (1979) com o trabalho de conclusão “Kvinnoanalysen inom den Klassiska Marxismen” (A análise da mulher no marxismo clássico). Logo depois, concluiu o mestrado em Ciências Sociais (1980) com a dissertação “Arbetsprocessens Dubbelkaraktär: En Kritik av Bravermans Degraderings Teser” (O Duplo Caráter do Processo de Trabalho: Uma Crítica às Teses de Degradação de Braverman).
O retorno ao Brasil, no início da década de 1980, deveu-se à Lei da Anistia (1979). Em 1981, residindo em Campinas, recebeu convite do Professor Amílcar Herrera para ser pesquisadora do Instituto de Geociências da UNICAMP. De 1981 a 1982, foi bolsista de doutorado da Universidade de Uppsala e, a partir de 1983 passou a ser pesquisadora do NPCT-UNICAMP no projeto “Prospectiva Tecnológica para a América Latina”. Em 1984, iniciou suas atividades como docente do Instituto de Geociências (UNICAMP).
Leda Gitahy teve importante contribuição, ao lado do Professor Amílcar Herrera e equipe, para a criação do Instituto de Geociências, particularmente do Departamento de Política Científica e Tecnológica (1985) e do Programa de Pós-Graduação em Política Científica e Tecnológica (1988). Em 2000, Leda voltou à Suécia para defender seu doutorado em Sociologia com a tese “A New Paradigm of Industrial Organization: The diffusion of Technological and Managerial Innovations in the Brazilian Industry”, orientada pelo Professor Pablo Suarez, composta por uma introdução teórico metodológica e seis artigos publicados. Foi a primeira tese da Universidade de Uppsala (criada em 1477) a ser publicada na internet.
Há mais de quatro décadas, dedica-se a importantes estudos na área do trabalho, ciência e tecnologia. Leda Gitahy tem relevante coordenação e/ou participação em pesquisas nacionais e internacionais, destacando-se em discussões inovadoras e críticas sobre organização do trabalho, processos de reestruturação produtiva, mudanças tecnológicas e trabalho, mulher e trabalho, mulheres e sindicato, divisão sexual do trabalho, movimentos sociais, mercado de trabalho, sindicatos, algoritmos e desinformação e outras temáticas de grande relevância social e acadêmica.
Seu perfil solidário e colaborativo contribuiu para a formação de redes de pesquisadores de diversas instituições nacionais e internacionais. A partir de parcerias com Elizabeth Souza Lobo (in memoriam), Helena Hirata, Rosa Lúcia Moysés, John Humphrey, Alice Rangel de Paiva Abreu, Elizabeth Bortolaia Silva, Alice Abreu, Nadya Araújo Guimarães, Márcia Leite e José Ricardo Ramalho, organizou grupos de pesquisa e de trabalho, participou da criação do GTs na ANPOCS, na ABET e na Red Latinoamericana de Educación Trabajo – ALAST. Coordenou diversos projetos de pesquisas fomentados tanto por instituições nacionais quanto por internacionais (CNPq, CAPES, FINEP, Fapesp, etc.). Destacamos dois projetos atuais e aprovados pela Fapesp, a saber, um internacional ENDURE: Inequalities, Community Resilience and New Governance Modalities in a Post-Pandemic World convênio/acordo com Trans-Atlantic Plarform for the Social Sciences and Humanities e outro nacional sobre Desinformação, Negacionismo e Divulgação Científica.
Atua no Departamento de Política Científica e Tecnológica – DPCT/IG/Unicamp, além de professora colaboradora do Doutorado em Sociedade, Natureza e Desenvolvimento da Universidade Federal do Oeste do Pará, Coordenadora do Laboratório de Tecnologia e Transformações Sociais (LabTTS), membro do Grupo de Estudos sobre Desinformação nas Redes Sociais da Unicamp e da Rede Infovid entre outros.
Leda sempre foi docente e orientadora dedicada, amorosa e com capacidade intelectual ímpar, partilhando solidariamente sua sabedoria. Orientou vários projetos de pesquisa que resultaram em dezenas de mestras/es e doutoras/es atuando no Brasil e fora, pesquisadoras/es e professoras/es comprometida/os com um entendimento aprofundado e orientado. Professora Leda Gitahy marcou vidas e fez história. Sua visão peculiar desconstrói a visão engessada da ciência e inova nos métodos e nos temas, pensando à frente de seu tempo, somada ao seu jeito acolhedor, de se preocupar com todos. Por vários momentos, em que seus orientandos de pós-graduação estavam desanimados, desesperados e por vezes desiludidos, ela sempre diz: “Nunca percam a esperança”!
Sugestões de obras da autora:
AZEVEDO, Alessandra B. A.; GITAHY, Leda. The Cooperative Movement, Self-Management, and Competitiveness: The Case of Mondragón Corporación Cooperativa. Working USA, v. 13, p. 5-29, 2010.
GITAHY, Leda; HIRATA, H.; HUMPHREY, J.; MOISÉS, R.; LOBO, E. Le sexe du travail – Structures familiales et système productif. Presses Universitaires de Grenoble, 1984. 320p.
GITAHY, Leda; HUMPHREY, John; LOBO, Elizabeth. Lutas operárias e lutas das operárias em São Bernardo do Campo. A Classe operária tem dois sexos: trabalho, dominação e resistência. São Paulo: Brasiliense, 1991, p. 17-46.
GITAHY, Leda; ARAUJO, Angela M. C. ; RACHID, A. ; CUNHA, A. M. . Brazil: Between Global Trends and National Politics – Restructuring and Worker’s Responses. In: Nichols, T. and Cam, S. (Org.). Labour in a Global World – Case Studies from the White Goods Industry in Africa, South America, East Asia and Europe. Hampshire: Palgrave Macmillan, 2005, p. 173-205.
LOBO, Elizabeth; HUMPHREY, John; GITAHY, Leda; MOYSES, R. A “prática invisível” das operárias. In: Andrée Kartchevsks…et. al. (Org.). O Sexo do Trabalho. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, p. 131-144.
MEDEIROS, Iraci A.; GITAHY, Leda. Ecologia de saberes? Uma experiência de formação superior indígena. Educação e Socioeconomia Solidária: Fundamentos da produção social de conhecimento. 1ed.Cáceres: UNEMAT, 2019, v. 8, p. 99-128.
PARRA-ROMERO, Adela. GITAHY, Leda. Movimiento social como actor – red: Ensamblando el comité por la defensa del Agua y del Páramo de Santurbán. Universitas humanística, v. 84, p. 1-30, 2017.