Por Rodrigo Salles Pereira dos Santos (UFRJ)
José Ricardo Garcia Pereira Ramalho é Professor Titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), tendo nascido em 13 de setembro de 1950, no Rio de Janeiro (RJ). Filho de Lucilia Garcia Ramalho e Jether Pereira Ramalho, que viria a ser seu professor na UFRJ, José Ricardo ingressou na primeira turma de Ciências Sociais (1970-1973) a ser formada no novo prédio do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS), no Lgo. São Francisco, Centro do Rio.
A origem popular e a formação religiosa e política iniciada no ambiente familiar explicam, em parte, uma trajetória pessoal e profissional em que a reflexão sobre o mundo do trabalho se tornou indissociável do engajamento na transformação das condições de vida dos trabalhadores e, especialmente, pela redemocratização da sociedade brasileira. Essa sociologia pública esteve, desde as origens de sua formação, fortemente vinculada à pesquisa empírica. Suas primeiras publicações o atestam, privilegiando inicialmente os trabalhadores rurais e a questão agrária – em parceria com Carlos Rodrigues Brandão e Neide Esterci, com quem se casaria em 1976 – e, cada vez mais, o trabalho urbano e industrial, ainda nos anos 1970.
Entre 1974 e 1979, no entanto, durante o curso de Mestrado em Ciência Política na Universidade de São Paulo (USP), seu talento o levaria a pesquisar a vida das pessoas presas na então Penitenciária do Carandiru. Essa investigação, pioneira quanto ao tema, à área e à abordagem, derivou na publicação, em 1979, de “Mundo do crime: a ordem pelo avesso” (hoje em sua 4ª edição), prenunciando a centralidade da perspectiva dos atores na conformação do mundo social.
A tese de doutorado (1981-1987) defendida na USP consolidaria esse direcionamento, agora decididamente no campo do trabalho. Em parte resultante de um ambiente de colaboração interdisciplinar que congregava o IFCS e o Museu Nacional, “Estado-Patrão e luta operária: o caso FNM”, publicado em 1989, constitui uma representação magnífica das etnografias do trabalho de inspiração thompsoniana produzidas nos anos 1980, não apenas conferindo voz, mas convertendo a perspectiva do trabalhador na própria matriz da compreensão do trabalho.
A trajetória de José Ricardo Ramalho também assume traços institucionais largos, se confundindo com o próprio desenvolvimento das Ciências Sociais no Brasil. Tendo ingressado na carreira docente em 1979, se vincularia ao hoje denominado Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia (PPGSA) da UFRJ, estando à frente de sua coordenação em duas ocasiões (1987-1989; 1997-1999), integraria comitês de assessoramento da FAPERJ (2006-2009) e da CAPES (2006-2010), além de tornar-se Vice-Presidente da SBS (2003-2007) e Presidente da ANPOCS (2014-2016). Em todas essas atividades e funções, sua intervenção foi marcada pela expansão, cooperação interinstitucional, e excelência das Ciências Sociais. Em particular, seus esforços de constituição de parcerias no exterior foram fundamentais para a expansão e democratização das oportunidades de internacionalização que marcaram a área a partir dos anos 1990.
Por sua vez, a agenda de pesquisa que criou e consolidou em torno do polo automotivo do Sul do estado do Rio de Janeiro a partir de meados dos anos 1990 é uma das expressões mais relevantes de sua capacidade ímpar para reunir e coordenar um conjunto amplo e diversificado de pesquisadoras/es, investigando temas relacionados às dinâmicas ambientais, de desenvolvimento e de trabalho de modo eminentemente coletivo e interdisciplinar. Através do enfoque regional conferido à indústria automotiva, José Ricardo Ramalho vem se dedicando, desde então, à compreensão das dinâmicas globais do capitalismo, com ênfase nos novos implantes industriais e padrões de controle do processo de trabalho; na questão do desenvolvimento e nas formas “consensual” e confrontacional da ação coletiva em perspectiva comparada; assim como nos padrões em rede assumidos pela corporação e nas novas formas de solidariedade sindical transnacional.
Finalmente, suas atividades de ensino e pesquisa resultaram na orientação de mais de 70 discentes de iniciação científica, mestras/es e doutoras/es, em grande medida atuando no treinamento de novas levas de cientistas sociais. Somados aos mais de 140 artigos em periódicos e capítulos de livros e quase 20 livros autorais ou editados, é possível obter uma amostra de uma vida inteira dedicada à ciência e à formação de incontáveis pesquisadoras/es comprometida/os com um entendimento aprofundado e orientado, fundamentalmente, à transformação da realidade brasileira.
Sugestões de obras do autor
RAMALHO, J. R.; CARNEIRO, M. D. S.; VÉRAS DE OLIVEIRA, R. Configurações do desenvolvimento, trabalho e ações coletivas. São Paulo: Annablume, 2021. 581 p.
RAMALHO, J. R.; ESTERCI, N. (Orgs.).: Compromisso com as classes populares e resistência à ditadura. São Leopoldo: OIKOS Editora, 2017. 358 p.
RAMALHO, J. R.; CARNEIRO, M. D. S. (Orgs.). Ações coletivas em complexos mínero-siderúrgicos: experiências na Amazônia e no Sudeste Brasileiro. São Luis: EDUFMA, 2015. 352 p.
RAMALHO, J. R.; SANTOS, R. S. P.; LIMA, R. J. C. Estratégias de desenvolvimento industrial e dinâmicas territoriais de contestação social e confronto político. Revista Sociologia e Antropologia, v. 3, p. 175-200, 2013.
RAMALHO, J. R. Mundo do crime: a ordem pelo avesso. 4ª ed. Rio de Janeiro: Centro Edelstein, 2008. 165 p.
RAMALHO, J. R. Novas conjunturas industriais e participação local em estratégias de desenvolvimento. Dados – Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 48, n. 3, p. 147-178, 2005.
RAMALHO, J. R.; BEYNON, H.; ABREU, A. R. P. The Dream Factory: VW’s Modular Production System in Resende, Brazil. Work, Employment and Society, v. 14, n.2, p. 265-282, 2000.
RAMALHO, J. R. Estado patrão e luta operária: o caso FNM. São Paulo: Paz e Terra, 1989. 244 p.