Por Maria José De Rezende (UEL)
Sociólogo, nascido em 1936 em Patos (PB), no interior de uma família numerosa. Seu pai era de origem africana e sua mãe de origem indígena. Desde muito cedo, no final da década de 1950 e no decorrer da de 1960, atuou em várias frentes com objetivo de ampliar a participação política, o acesso à educação, à moradia e aos direitos sociais e humanos das populações em situação de miserabilidade e exclusão multidimensional.
A atuação política em prol de melhorias sociais o fez entrar em rota de colisão com alguns grupos que não toleravam ações e práticas políticas que levassem os muitos segmentos populacionais, abandonados pelo poder público, a terem quaisquer expectativas de que os quadros de pobreza e de inacessibilidade aos serviços sociais básicos pudessem ser revertidos.
No final da década de 1950 e início da de 1960 incrementaram-se, em várias partes do país, ações políticas, das quais participavam intelectuais, estudantes, artistas, membros da Igreja Católica, professores e membros de diversos setores da sociedade civil organizada, atuantes em um processo que viesse a impulsionar a democratização e o reconhecimento de direitos. João Batista Filho atuou, ao longo desses anos, em várias frentes, entre as quais as que visavam ampliar, por meio da pedagogia de Paulo Freire, a alfabetização de adultos, a conscientização política e o direito de participação dos mais pobres em vários âmbitos da vida social.
Como partícipe da vida política nacional, ele já atuava junto aos setores populares, tanto no período pré-1964 quanto nos anos pós-1964, para ajudar a construção de pautas e de agendas adequadas a situar as demandas de tais segmentos no centro das reivindicações políticas. Por essa razão, ele veio a sofrer diversas perseguições a partir da imposição da ditadura militar e de seu endurecimento com a decretação do Ato Institucional n.5, em 1968.
As perseguições derivadas dessas práticas políticas fizeram-no sair da região nordeste e migrar para São Paulo, o que foi feito como meio de sobreviver aos processos repressivos que lançavam seus tentáculos para alcançar aquelas pessoas que se envolvessem em alguma atuação política não tolerada pela ditadura militar.
A larga experiência na atuação política, junto às camadas mais pobres, foi um impulso de aproximação aos estudos de Sociologia, na década de 1970. Sua trajetória como docente, pesquisador e extensionista se deu a partir dessas atuações e práticas sociais. Antes de fazer o curso na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, ele já havia cursado Teologia e Filosofia.
Habitando, com sua companheira Raimunda de Brito Batista, entre 1969 e 1970, na periferia da cidade de São Paulo, após uma migração realizada de forma compulsória, já que estava se escondendo dos asseclas do autoritarismo, presenciou todas as agruras que vivenciavam os habitantes desses bairros onde todos os serviços sociais eram escassos ou inexistentes. Conheceu de perto a pobreza, a miserabilidade, a fome, o desemprego, a exclusão e o não-acesso aos direitos de modo geral.
Entre os problemas sociais que mais lhe causavam impacto se destacava um em particular: a moradia precária, na qual não havia acesso a esgoto, água, arruamentos, transportes, escolas, postos de saúde e hospitais. Desde as suas primeiras atuações como sociólogo, ele esteve voltado para as questões referentes ao mundo urbano.
Seus projetos de pesquisa e de extensão tanto na Universidade Estadual de Londrina quanto na Universidade do Norte do Paraná estiveram relacionados ao planejamento urbano, à habitação precária, à miserabilidade, a exclusões, às desigualdades e ao não-acesso a direitos e às condições cidadãs.
No decorrer dos 25 anos em que permaneceu na UEL, foi um dos principais estudiosos do processo de favelização da cidade de Londrina. Suas análises partiam dos planos diretores da cidade, do planejamento urbano favorecedor da especulação imobiliária que potencializava o crescente processo de segregação de grupos expressivos da população. Todavia, juntamente com as pesquisas de campo ele desenvolveu um amplo trabalho de extensão nos bairros destituídos de qualquer infraestrutura urbana. Isso o levou a atuar na Coordenadoria de Extensão da UEL no sentido de estabelecer formas de ação que alcançassem tais populações em situação de absoluta exclusão.
A experiência extensionista, vivida após a aposentadoria na UEL, impulsionou, o desenvolvimento do projeto ”Resgate da Cidadania, uma Questão de Direito”, no qual se buscava mapear a situação de risco social em que viviam por volta de 150 mil pessoas na cidade de Londrina. O mapeamento incluía a situação de analfabetismo, baixíssima renda, desnutrição, fome, trabalho precário, desemprego e falta de documentos. Esse levantamento constatou que a grande maioria dessa população não tinha qualquer documento, o que revelava exclusão total, já que não podiam sequer reivindicar algum tipo de acesso aos programas governamentais.
João Batista Filho passou a coordenar um grupo de estudantes de Direito, que atuavam junto a esses grupos populacionais periféricos, com o objetivo de ajudá-los a fazerem os documentos e assim poderem existir diante do poder público e, consequentemente, tentarem acesso a alguns direitos, como o BPC (Benefício de Prestação Continuada).
A vivência nas periferias de São Paulo e de Londrina e o conhecimento profundo dos processos de tribulação cotidiana da população dessas regiões foi o lastro de suas pesquisas que resultaram tanto na tese de doutoramento, intitulada O Projeto Cura no Parque Guanabara: uma política-programa de renovação urbana em Londrina, realizada entre 1980 e 1985 na Universidade de São Paulo (USP) sob a orientação de Henrique Rattner (1923-2011), quanto nos dois trabalhos de pós-doutoramento que foram realizados na França. O primeiro foi elaborado na Université Paris-Est Créteil Val-de-Marne entre 1989 e 1990, no qual comparou os programas de habitação popular entre três países: Brasil, França e Polônia, com a supervisão de Henry Coing, e o segundo se desenvolveu entre 2008 e 2009, no Centre de Recherche Sur le Brésil Contemporain de I’Ecole des Hautes Etudes, sobre as questões jurídicas na habitação popular tendo Afrânio Raul Garcia como supervisor.