Por Mario Medeiros (Unicamp)
A socióloga Elide Rugai Bastos nasceu em São Manuel, interior de São Paulo, em 09 de março de 1937, em uma família de origem migrante italiana, sendo seus pais e outros parentes ligados à agronomia. No começo dos anos 1950, realiza seus estudos em colégio interno para moças, primeiramente em Botucatu e posteriormente na capital paulistana, cidade onde também se formou no Conservatório Musical, dedicando-se ao piano.
Nos estudos superiores, formou-se em Filosofia, na Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), graduando-se entre 1956 e 1960. Foi docente da mesma instituição entre 1961 e 1989, no curso de Ciências Sociais e programa de pós-graduação.
A dedicação à pesquisa na área de Ciências Sociais se concretizou por meio da realização de seu mestrado em Ciência Política na Universidade de São Paulo (USP), sob a orientação de José Augusto Guilhon de Albuquerque, estudando o processo de formação e impacto político da Ligas Camponesas em Pernambuco, com foco nas pesquisas de sociologia rural e questão agrária, que originou seu primeiro livro, em 1984, intitulado As Ligas Camponesas.
Ainda como docente na PUC-SP, na mesma instituição, ela realizou o doutorado em Ciências Sociais, dedicando-se aos estudos do pensamento social de matriz conservadora e sua influência no país, tomando por objeto a obra de Gilberto Freyre, num momento em que esse sociólogo era pouco analisado em razão de suas tomadas de posições políticas. A orientação do doutorado ficou a cargo de Octavio Ianni e o trabalho desenvolvido entre 1982 e 1985 foi defendido com o título de “Gilberto Freyre e a formação da sociedade brasileira”, tornando-se anos mais tarde o livro premiado As criaturas de Prometeu: Gilberto Freyre e a formação da sociedade brasileira.
Importa destacar que, na PUC-SP, Bastos lecionou sociologia ao lado de Carmem Junqueira, Beatriz Muniz, Cândido Procópio Camargo, Renato Ortiz, bem como de Florestan Fernandes, Octavio Ianni, Maurício Tragtenberg e outros cientistas sociais atingidos, cassados e retornados do exílio pelas medidas do golpe de estado civil-militar e seus atos institucionais, num momento em que a PUC-SP e a Arquidiocese de São Paulo tiveram papel importante no abrigo institucional aos intelectuais.
Neste sentido, o contexto social, político e institucional das mudanças do ensino superior e, em particular, na área de Ciências Humanas e Sociais impactam a geração da qual Elide Rugai Bastos faz parte ou com que conviveu, tendo sido aquela geração desafiada pelos arbítrios da ditadura civil-militar na universidade e a luta pela redemocratização do país. Vigilância em sala de aula, sobre temas de pesquisa, cerceamento de carreiras acadêmicas e projetos intelectuais, de um lado; bem como a organização da sociedade civil em setores variados e dos movimentos sociais insurgentes contra o contexto ditatorial (mulheres, operários, negros, homossexuais, movimentos de periferia contra a carestia, Anistia, camponeses etc.) compõem o horizonte de ideias e forças sociais no qual Bastos e seus colegas estavam inseridos.
Elide Rugai Bastos também lecionou na UNESP de Araraquara, entre os anos 1987 e 1989, dedicando-se aos estudos de sociologia rural, questão agrária, movimentos sociais e pensamento social brasileiro. Em 1989 ingressou na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde se tornaria professora livre-docente (1998) e professora titular (2006) do Departamento e Programa de Pós-Graduação de Sociologia. Neste período realizou pós-doutorado na Universidade de Madrid, entre 1992 e 1993.
Na Unicamp, junto de Octavio Ianni, Rubem M. Leão Rego e Walquíria D. Leão Rego foi responsável por consolidar a área de estudos do Pensamento Social no Brasil e Pensamento Social na América Latina, sendo co-fundadora do Centro de Estudos Brasileiros (CEB) e da revista Trapézio, formando estudantes e pesquisadores em cursos de graduação e pós-graduação no amplo espectro que o Pensamento Social permite. Tornou-se umas das principais especialistas da área, em particular nos estudos sobre Gilberto Freyre, Florestan Fernandes, pensamento social brasileiro, iberismo e estudos sobre o pensamento conservador.
Após sua aposentadoria, em 2007, mantém constante atividade como professora colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Unicamp, em projetos com Universidade Federal do Amazonas (UFAM), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp); centros de pesquisas, tais como o Centro de Estudos de Cultura Contemporânea (CEDEC) e o Instituto de Estudos Avançados (IEA-USP). Sua atuação institucional também se evidencia por ter participado como membro do Comitê de Área da Fundação de Amparo à pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), entre os anos 2013-2019 ter sido editora da Revista Brasileira de Ciências Sociais da Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais (RBCS-Anpocs), entre 2001 e 2005 e da revista Lua Nova (CEDEC) entre 2009 a 2014.
Entre as principais premiações recebidas pela obra e carreira estão o Prêmio do Concurso Nacional de Ensaios Gilberto Freyre, da Fundação Gilberto Freyre (2005); o Prêmio de Reconhecimento Acadêmico Zeferino Vaz, da Unicamp (2007); e o Prêmio de Excelência Acadêmica Flávio Pierucci, da Anpocs (2017).
É de destacar, sobretudo, sua capacidade de formação de estudantes e incentivo a jovens investigadores nos temas de pesquisa a que se dedicou. Vários deles se tornaram professoras, professores, pesquisadoras e pesquisadores em instituições no Brasil e no exterior, como IFRN, UFAM, UNESP, UFPR, UFRJ, UFSCar, UNICAMP, UNIFESP, UFSC, Unimep, PUC-Campinas, Princeton University, École des Hautes Études en Science Sociales.
Sugestões de obras da autora:
RUGAI, Elide. As Ligas Camponesas, Rio de Janeiro: Vozes, 1984
RUGAI, Elide. O pensamento de Oliveira Vianna. Campinas: Ed.Unicamp, 1993 (com João Quartim de Moraes)
RUGAI, Elide. Intelectuais e política: a moralidade do compromisso. São Paulo: Olho d’ água, 2001 (com Walquíria D. Leão Rêgo)
RUGAI, Elide. Gilberto Freyre e o pensamento hispânico. Bauru, SP: Edusc, 2003.
RUGAI, Elide. Intellectuels et politique: Brésil-Europe. Paris: L’Harmattan, 2003 (com Dennis Rolland e Marcelo Ridenti)
RUGAI, Elide. Conversa com sociólogos brasileiros. São Paulo: 34, 2006 (com Fernando Abrúcio, Maria Rita Loureiro e José Márcio Rego)
RUGAI, Elide. Intelectuais e Estado. Belo Horizonte: UFMG, 2006 (com Denis Rolland e Marcelo Ridenti)
RUGAI, Elide. As Criaturas de Prometeu: Gilberto Freyre e a formação da sociedade brasileira. São Paulo: Global, 2006
RUGAI, Elide. O moderno em questão: a década de 1950 no Brasil. Rio de Janeiro: Topbooks, 2008 (com André Botelho e Gláucia Villas-Bôas)
RUGAI, Elide.Vozes da Amazônia, vols. I, II e III. Manaus: EDUFAM, 2007, 2014, 2016 (com Renan Freitas Pinto)