Por Brauner Cruz Junior (IESP-UERJ)
Nascida em Araraquara, interior de São Paulo, no dia 18 de dezembro de 1952. Socióloga formada na própria cidade natal pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, a UNESP, a professora Antonia de Lourdes Colbari é um nome fundamental para a articulação teórica e prática entre a sociologia econômica, do trabalho e das organizações.
De família humilde e origem rural, com o pai caminhoneiro e a mãe dona de casa, Colbari se interessou pelo curso de Ciências Sociais como uma maneira de manter-se próxima de seu interesse pela Filosofia, História e Literatura. Ler era um hábito e uma paixão. Ela, então, ingressou em 1971 no curso de Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL) de Araraquara, pouco antes desta ser incorporada à UNESP.
Em 1975, foi para o Mestrado em Sociologia da UNICAMP, estimulada por professores de Economia de quem havia sido monitora durante a graduação. Em Campinas, foi orientada por Vera Lucia Botta Ferrante, que se tornou sua amiga e importante referência profissional.
Sua Dissertação, contudo, só foi defendida em 1981, com o título “Legislação Trabalhista e Industrialização no Brasil”. Isso porque, ao terminar os créditos do Mestrado, no final de 1976, ingressou na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) como professora colaboradora. Começava, em 1977, uma longeva e produtiva trajetória nessa Universidade onde Antonia Colbari iria se tornar professora titular, já em 2014.
Em 1983, Colbari interrompe momentaneamente a trajetória na Ufes para se dedicar ao doutorado, feito no Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), hoje Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP). Orientada pelo professor Luiz Jorge Werneck Vianna e influenciada pelos trabalhos de Juarez Brandão Lopes e pelos conselhos do professor Luiz Antonio Machado da Silva, que esteve em sua banca, ela desenvolve uma pesquisa fundamental para introduzir seu principal interesse acadêmico: como as relações sociais ligadas ao trabalho são legitimadas. Assim, com a tese “Provedores de família e operários-Padrão: a versão brasileira da ética do trabalho”, Colbari busca discutir uma versão brasileira da ética do trabalho e sua íntima relação com o âmbito familiar, destacando-o como importante base cultural de legitimação. Em termos de influência teórica, há em sua pesquisa um diálogo importante com noções de Marx, Gramsci, Weber e mesmo Geertz.
Antonia Colbari dialoga intensamente com a sociologia das organizações, mobilizando a literatura aplicada à administração para pensar as relações de trabalho. Neste esforço intelectual, também se põe em contato com a sociologia econômica ao pensar nas intersecções desta com a dinâmica produtiva e profissional das empresas e a economia moral das famílias na relação com o trabalho. Assim, pesquisou e produziu estudos ligados a temas como as relações de trabalho e o movimento sindical, os aspectos ideológicos e valorativos nas representações sobre o trabalho e nas organizações, e as dinâmicas de qualificação e capacitação frente às mudanças culturais ligadas ao trabalho. Mais recentemente, Colbari tem concentrado esforços em investigar a relação entre empreendedorismo, um tema por ela bastante desenvolvido, e o trabalho assistido. Ela se destaca por ser uma das poucas vozes dentro da sociologia que analisa a retórica do empreendedorismo dentro da complexidade que ela enseja, considerando sua problemática, mas também levando em conta as ambiguidades suscitadas na acepção desse discurso pelos indivíduos e suas famílias.
Sua interdisciplinaridade na produção acadêmica, que é também uma de suas principais virtudes enquanto socióloga, foi também influenciada por sua trajetória como professora na UFES. Quando ingressou na instituição, o curso de ciências sociais ainda não havia sido criado. Sendo assim, ministrou aulas em cursos como o de Administração, Serviço Social, Direito e até na Medicina e nas Engenharias. Assim, desenvolveu e explorou a capacidade de colocar em diálogo uma série de saberes. Em 1990, quando foi criada a graduação em Ciências Sociais, pôde ministrar disciplinas mais ligadas a questões teóricas e empíricas de sua formação. Em 1996, tornou-se docente do curso de pós-graduação em Educação da UFES, onde ficou até 2010. Em 2000, também se tornou professora da pós-graduação em Administração, onde permanece desde então. Finalmente, em 2008, quando criado o curso de pós-graduação em Ciências Sociais, Antonia Colbari também juntou-se à equipe, onde ministra aulas e orienta alunos.
A atuação política de Colbari enquanto docente também é carregada de importância. Ao final da década de 1970, quando o país vivia intenso processo de redemocratização, ela participou da criação da Associação de Docentes da UFES (Adufes), em 1978, e da Associação dos Docentes de Ensino Superior (Andes), em 1981, depois transformada em sindicato. A série de reivindicações e greves organizadas por essas instâncias possibilitou ganhos significativos para a estruturação da carreira docente no estado, além de ir ao encontro de um importante movimento nacional que visava novas organizações profissionais em torno do chamado “novo sindicalismo”.
A trajetória de Antonia Colbari não é somente marcante pelos seus valorosos estudos em torno do sindicalismo, da identidade ligada ao trabalho e sua relação com o mundo organizacional, e do debate sobre o empreendedorismo. Ela também está marcada por uma intensa e apaixonada dedicação ao ofício como professora, aspecto esse muitas vezes esquecido na trajetória de um sociólogo ou socióloga de destaque. Entre as tarefas intelectuais que desenvolveu e desenvolve, Colbari busca se desvencilhar de amarras ideológicas e do formalismo teórico, buscando sua autonomia analítica e inspirando muitos e muitas a buscarem caminho semelhante.
Sugestões de obras da autora:
COLBARI, A. Ética do Trabalho: A Vida Familiar na Construção da Identidade Profissional. São Paulo: Letras & Letras/EDUFES, 1995. 278p.
COLBARI, A. Rumos do movimento sindical no Espírito Santo. Vitória: EDUFES (Editora da Universidade Federal do Espírito Santo) e Florecultura, 2003. 198p.
COLBARI, A. A retórica do empreendedorismo e a formação para o trabalho na sociedade brasileira. Sinais (UFES), v. 1, p. 1-28, 2007.
COLBARI, A. L. Estratégias institucionais e construções discursivas no campo do desenvolvimento local. Política & Sociedade (Impresso), v. 12, p. 13-40, 2013.
COLBARI, A. L. Empreendedorismo e capital social no discurso institucional do Sebrae. Simbiótica. Revista Eletrônica, v.1, p. 1-25, 2014.
COLBARI, A. L. Do autoemprego ao microempreendedorismo individual: desafios conceituais e empíricos. RIGS – Revista Interdisciplinar de Gestão Social, v. 4, p. 165-189, 2015.
COLBARI, A. L. Integridade para Pequenos Negócios e desencantamento da moral. Contemporânea – revista de sociologia da UFSCar, v. 9, p. 123-144, 2019.