Por Valeria Floriano Machado (UFPR)
Maria Tarcisa Silva Bega, professora titular do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Paraná (UFPR), integra o Programa de Pós Graduação em Sociologia e o Mestrado Profissional de Sociologia em Rede Nacional. Com vasta produção acadêmica, tem trajetória ativa na UFPR, orientada desde sempre no compromisso em relação à própria razão de ser da Universidade, pautada na articulação ensino, pesquisa e extensão.
O desafio aqui é pensar na trajetória da Maria Tarcisa não apenas como uma sucessão de escolhas racionais e afetivas ou como reflexo de um determinado contexto, mas, sim, como resultado da tessitura constituída de palavras-bordados-poesia no tempo vivido (ou sonhado) que foi amarrando a vida vivida (ou que se foi amarrando à vida cotidiana) nas miudezas, nas surpresas e nos desafios postos continuamente à sua trajetória profissional.
Nascida em Pitangueira, interior de São Paulo, em 16 de agosto de 1953 é a única filha da união de seus pais. Desde a infância observava a lavra dura do trabalho agrícola dos pais e do difícil empreendimento familiar para garantir que seus meio-irmãos – filhos do primeiro casamento de seu pai – estudassem no seminário. Experienciando a migração familiar na primeira infância, aos 10 anos de idade tornou-se interna no Colégio de Freiras de Lupionópolis, no Paraná, recebendo formação escolar básica na escola estadual da cidade. Entre 1968-1970 foi aluna do Ensino Normal e aos 17 anos, diplomada, foi influenciada pelos irmãos a dar continuidade aos estudos, mudando-se para a capital do Estado, onde já estudava um dos seus irmãos.
Aprovada no vestibular, em 1971, iniciou o curso de Ciências Sociais na UFPR, passando a morar na Casa da Estudante Universitária (CEUC). Neste período, a referência ao irmão conhecido por “Baiano”, estudante de engenharia elétrica e conhecido militante do movimento estudantil deram-lhe – além da alcunha de “Baiana” – o acolhimento pelas mulheres militantes da CEUC. O amadurecimento (pessoal e acadêmico) vivenciado no período duro da ditadura militar foi marcado pela participação como monitora no Curso, pelas conversas nas cantinas, pelas reuniões conflitantes do movimento estudantil, por leituras clandestinas da literatura marxista e pela angústia constante da perseguição ao irmão e aos amigos. Tudo isso fez com que, no enredamento das tramas do vivido, o encantamento pela política concorresse com o fazer sociológico.
Recém-formada, passou a lecionar como professora substituta na Faculdade de Administração e Economia (grupo Bom Jesus). Em 1976 foi convidada, pela professora Lia Zanotta Machado, a fazer parte da equipe de técnicos pesquisadores do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES), compondo a equipe multidisciplinar que faria parte do projeto “Diagnóstico Habitacional da Região Metropolitana de Curitiba (RMC)”, estudo sobre a condição habitacional da região. Ainda como técnica do IPARDES, ingressou em 1982 no mestrado em Sociologia da USP e, orientada pelo Professor Paulo Argimiro da Silveira Filho, defendeu a dissertação intitulada “Participação Comunitária: dimensões da institucionalização”, trabalho que analisava a organização das Instituições do Estado no contexto da redemocratização do país e vinculava sua trajetória à área de políticas públicas.
Em 1991 foi aprovada em concurso para professora assistente na UFPR. No período (de 1990 a 2000), tanto o Departamento quanto o Curso de Ciências Sociais passaram por grandes transformações, como a reforma curricular e a extinção do curso de Estudos Sociais, além da criação do Programa de Mestrado com concentração na área de Sociologia das Organizações. Neste ínterim, seu vínculo com as atividades de extensão e a experiência acumulada como pesquisadora do IPARDES motivaram o convite – dos professores José Antônio Peres Gediel, do curso de Direito, e Milena da Costa Martinez, do DECISO, para que participasse do projeto de extensão intitulado XAPINHAL, que reunia professores de várias áreas, visando ações mais efetivas no campo da extensão voltadas às comunidades localizadas na região sul da cidade de Curitiba. Esse grande projeto contou com a experiência anterior da profa. Maria Tarcisa para o levantamento socioeconômico das famílias, o mapeamento das moradias e o levantamento dos equipamentos públicos a fim de definir os espaços de intervenção do projeto. A partir dos resultados positivos desta experiência, Tarcisa seria convidada, em 1994, a assumir a Coordenadoria de Extensão (COEX) da Pró-Reitoria de Extensão e Cultura.
Em 1998, já em curso do seu doutoramento na USP, Maria Tarcisa participou da pesquisa “Juventude, Violência e Cidadania, o caso de Curitiba”, projeto vinculado ao MEC/UNESCO/Secretaria de Estado da Educação do Paraná e liderada por Ana Luísa Fayet Sallas.
Em 2001 defendeu a tese “Sonho e invenção do Paraná. Geração simbolista e a construção de identidade regional”, orientada por Sérgio Miceli, na qual analisou a importância da corrente literária simbolista na formação do campo intelectual paranaense.
Logo após a defesa, assumiu, em 2002, a Pró-Reitoria de Extensão e Cultura, atividade exercida até 2003 quando passou à função de vice-reitora (2003 a 2006). É importante destacar o papel fundamental que teve nesta função para a aprovação do Plano de Metas e Inclusão Social e Racial. Neste período também foi coordenadora das Cátedras UNESCO Cultura da Paz e Sérgio Vieira de Melo (ACNUR), contribuindo para criação do Centro de Cultura e Imagem da América Latina (CECIAL) em 2005, congregando pesquisas sobre cultura, imagem e imaginário sobre a América Latina.
Ainda nas lides administrativas, entre 2006 e 2014, foi Diretora do Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes (SCHLA). Em 2013, já ao final de sua gestão criou, em parceria com a professora Eliza Maria Vasconcelos de Almeida, o Programa de Desenvolvimento Urbano e Regional (PDUR) que reúne um grande número de docentes e estudantes de graduação e pós-graduação. Concomitantemente, em 2014, assumiu a coordenação institucional do Projeto do Livro Didático de Sociologia, dentro do II Plano Nacional do Livro Didático (II PNLD). Estas atividades motivaram a reflexão acerca das experiências de ensino, pesquisa e extensão acumuladas nas últimas décadas e levaram-na à organização da linha de pesquisa sobre Políticas Públicas para as Juventudes e também à elaboração do projeto pós-doutorado “Normalização ou controle social? Análise comparativa das experiências de políticas públicas para a juventude: Brasil, México e Portugal”, desenvolvido na Universidade de Lisboa em 2015.
É Coordenadora do Grupo de Pesquisa Sociologia e Políticas Sociais-CNPq e membro titular do Instituto Mercosul de Estudos Avançados (IMEA). Durante a pandemia coordenou a pesquisa “Direitos Humanos, entre o público e o privado: monitoramento do efeito-território na pandemia do Coronavírus da RMC”, garantindo que o PDUR e o Grupo de pesquisa se mantivessem ativos e produtivos, organizando, através das plataformas disponíveis, sociabilidades virtuais e encontros acadêmicos, promovendo uma rede de afeto que traduz a dedicação, generosidade e sensibilidade e que, intercambiáveis, expressam tanto sua vida cotidiana quanto sua produção sociológica.
Sugestões de obras da autora:
BEGA, MARIA TARCISA SILVA. Lugares da pesquisa e ensino nas Humanidades no Século XXI. In: Gonçalves, M.C.S.;JESUS, B.G.. (Org.). Educação Contemporânea ¿ Volume 17 ¿ Reflexões. 1ªed.Belo Horizonte: Editora Poisson, 2021, v. 17, p. 7-20
BEGA, MARIA TARCISA SILVA. Letras e política na Paraná: simbolistas e anticlericais na República Velha. 1ª. ed. Curitiba/PR: Editora da UFPR, 2013. v. 1. 540p.
SALLAS, A. L. F. ; VILLA, R. A. D.; BEGA, M. T. S. . Os jovens de Curitiba: esperanças e desencantos. 2ª. ed. Curitiba-PR: Editora da UFPR, 2008. v. 1. 440p.
Sobre a autora:
FREITAS, Sabrina e MATTAR, Kamille. Entrevista: 10 anos do Seminário Nacional de Sociologia Política: um balanço crítico por Maria Tarcisa Silva Bega. Novembro 2018. Sociologias Plurais – Revista Discente do Programa de Pós-Graduação em Sociologia – UFPR4. (3)