Nota de pesar: Maria Francisca Pinheiro Coelho

Publicado em 6 de março de 2025

Maria Francisca Pinheiro CoelhoFaleceu neste domingo, dia 2 e março de 2025, aos 77 anos, a professora titular aposentada da Universidade de Brasília, Maria Francisca Pinheiro Coelho, nascida em Jaguaribe (CE) em dezembro de 1947. Francisca era formada em ciências sociais pela Universidade do Ceará (1974) e fez mestrado e doutorado na UnB. A professora deixa uma vasta produção acadêmica, como a biografia do colega de movimento estudantil na UFC, intitulada  José Genoíno, escolhas políticas, e as obras Política, Ciência e Cultura em Max Weber, Políticas Sociais para o Desenvolvimento pela UNESCO, A Esfera da Política e  O Público-privado na Educação. Também foi presidente da ADUNB (1998/2000) e uma das fundadoras do PT nacional e local. Sua vida decorreu entre duas grandes paixões: a academia e a política.

Na academia, as principais contribuições de Francisca ao longo da sua carreira se referem às questões educacionais, sobretudo ao debate sobre o ensino público e laico. Também se referem ao pensamento de Hanna Arendt, na discussão sobre a democracia, tanto que fez seu último pós doutorado na Alemanha pesquisando nos arquivos sobre essa grande pensadora. Ou seja, a Sociologia da Educação e a Sociologia Política foram seus grandes eixos de análise e produção.

No lançamento do livro de Francisca intitulado “O Público e o privado na Educação Brasileira: o Conflito na Constituinte” eu afirmei que a minha alegria com esse lançamento se devia a várias razões. Inicialmente, pelo fato, indicado pela própria
autora, de que o momento da Constituinte foi marcado pelo espírito de uma época, a democracia. A Assembleia Nacional Constituinte aconteceu na chamada Nova República, com uma intensa participação da sociedade civil, cheia de esperança de
mudanças, depois de 21 anos de ditadura. Em segundo lugar, porque participei também desse período, pois fazíamos parte de um grande projeto de pesquisa com as professoras Maria Lucia Maciel, Ana Maria Fernandes entre outros, durante a
Constituinte, e na qual pudemos acompanhar de perto as Comissões da Família, Educação, Cultura e Esportes e a outra de Ciência, Tecnologia e Comunicação.

Finalmente, e não menos importante, pelo fato de ser dos melhores estudos que já li sobre a manifestação de conflitos de interesses, tema clássico e contemporâneo da Sociologia. Esse conflito, protagonizado pelos republicanos versus liberais
conservadores, não se expressaram apenas no campo da educação, embora a análise da autora tenha se detido nesse campo, no que concerne especificamente ao debate público e privado. A própria autora afirmava, que esse debate, embora marcante na educação, não é uma exclusividade dela. A polêmica se reproduz em outras atividades da esfera social, o que termina por extrapolar o problema para as políticas públicas.

Finalmente, gostaria de destacar algumas qualidades pessoais que pude apreciar durante nossa longa convivência. Embora já conhecesse Francisca desde a realização do mestrado na UnB, fomos da primeira turma do nosso doutorado em sociologia em 1984. Ela trabalhava mais na área de sociologia da educação e eu na de sociologia da ciência, mas tínhamos muita proximidade. Além disso, éramos e fomos durante toda a vida professoras, colegas da sociologia na UnB, atualmente já aposentadas e amigas. Nesse convívio, o que mais me impressionava em Francisca era a sua integridade e firmeza com os princípios políticos e a postura acadêmica. Essa guerreira cearense teve uma importância política muito grande no movimento estudantil em Fortaleza e na fundação do Partido dos Trabalhadores. Era muito firme, mas não fundamentalista nos princípios políticos, pois criticava o que era preciso ser criticado e também defendia arduamente o que achava correto.

Há vinte dias atrás, nos encontramos no cinema. Vimos o filme “O Conclave“ e comentamos. Não imaginava que seria a última vez que nos veríamos. Na segunda feira passada me ligou, depois de operada, para pedir que eu a substituísse numa
banca, ainda falando com voz forte. Eu estava impossibilitada naquele dia, mas me ofereci para outra data. Não imaginei que o estado dela se agravaria tanto. Não consegui mais falar com ela. Foi a última vez mesmo. Deixa um vazio imenso na nossa Sociologia, mas seu legado como pessoa e como professora estão ainda aqui. Sigamos adiante, a partir desse legado, analisando e lutando pela democracia e pela educação pública.

Fernanda Antônia da Fonseca Sobral 
Professora Emérita da Universidade de Brasília (UnB).

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